quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

If I could be who you wanted...






Remexendo em meus guardados, achei uma seleção que intitulei "continhos". Cometi o erro de não anotar o nome do autor, e agora não o sei para lhe conceder os créditos. Mas vale muito ler. Então, eis-lo aqui.

"A promessa

Lábio-me com seu beijo, esquecendo as infelicidades polvilhadas por um deus sádico, ventre-me com o desvelo mais generoso, alma-me de nós penetra, de alvos murmúrios e sons de ódio, o dia mesmo. 

Quantos dois de um outro, quase impossível acreditar num verbo tão impotente, amar. Co(r)pos esparramados pelo púlpito, padre a observá-los numa frenética busca pelo onipotente, alcorão aberto enquanto Minotauro usando de seu fio, Ariadne encara, mãos clitóricas a despejar meneios de algodão, flácida dor de encantos num voo trêmulo rumo ao filho impossível, dono de nós, putas rejeitadas, coroinhas indecentes, bispos panteístas, meu latim arrogante para a boca sedenta de novos sêmens, travesti onírico para as fomes de todos os buracos, enquanto nos transbordamos deste sangue virginal que usamos para brindar à Baco e comemos da sua carne, minha querida, fonte incessante para meu canibalismo, então poderemos estar juntos, um dentro e outro, fora, numa dança para a remissão dos instintos que escondemos até hoje, quando tudo se modificou.


Amém." 



terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Aborrecida


 
 
Minha estupidez não me deixa ver... Nunca aconteceu, a não ser na minha ignorância de querer o que você jamais foi pra mim. Não vejo mais aquele sorriso, nem verei. Avisto apenas uns olhos mornos e uma sombra de mulher ao teu lado.

E nem sei por que ainda dói. Uma dor morna, aborrecida. Um fantasma pra me assombrar nos cantos do tempo onde você ainda existe. Tuas mãos que ela toca ao acordar e que eu, estúpida, não.

Arrasto você morto no meu peito, remexo no vazio onde há terra bruta de onde arroto as lembranças do quase nada que me deste.

Vou tocar fogo na memória e espalhar as cinzas da tua cor num canto da vida, em algum gole amargo até queimar os ossos, e esquecer.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Anúncio









Sendo este um jornal por excelência, e por excelência dos precisa-se e oferece-se, vou pôr um anúncio em negrito: 

precisa-se de alguém homem ou mulher que ajude uma pessoa a ficar contente porque esta está tão contente que não pode ficar sozinha com a alegria, e precisa reparti-la. 
Paga-se extraordinariamente bem: minuto por minuto paga-se com a própria alegria. É urgente pois a alegria dessa pessoa é fugaz como estrelas cadentes, que até parece que só se as viu depois que tombaram; precisa-se urgente antes da noite cair porque a noite é muito perigosa e nenhuma ajuda é possível e fica tarde demais.
Essa pessoa que atenda ao anúncio só tem folga depois que passa o horror do domingo que fere. Não faz mal que venha uma pessoa triste porque a alegria que se dá é tão grande que se tem que a repartir antes que se transforme em drama. Implora-se também que venha, implora-se com a humildade da alegria-sem-motivo. 
Em troca oferece-se também uma casa com todas as luzes acesas como numa festa de bailarinos. Dá-se o direito de dispor da copa e da cozinha, e da sala de estar. 

P.S. Não se precisa de prática. E se pede desculpa por estar num anúncio a dilacerar os outros. Mas juro que há em meu rosto sério uma alegria até mesmo divina para dar.


Clarice Lispector

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Alívio




Alívio

 
Tudo bem, você dormiu.

Eu desço pra mais uma dose, um pouco mais de fumaça.

Enquanto você sonha não sou capaz de grudar os olhos.

E são tantas as palavras escapando que não posso segurá-las.

Enfim, o que sou eu e essas bobagens, com tanta dor espalhada pelos cantos?

O que são minhas lágrimas mudas por não me aceitares quando jorra sangue dos olhos de inocentes?

Não é nada, logo passa. Logo você olha pro lado, e agradece pelo milagre da vida, tão maior que essa bobagem que você sente. Por sentir-se só.

Apenas por  sentir um pouco de solidão. E quando você realmente pensa, olha de novo, pro lado, logo ali, tão perto. E vê a dor do outro, tão maior que a sua. Tão infinitamente mais penosa que essa alucinação de tristeza que você sente.

Então acorda feliz. Não dorme, mas sente aquele alívio por todos estarem vivos. Nem tão sãos, mas vivos.

 

Caminhem pra luz, pequenas crianças.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Tchá Tchá Tchá



Soldier Of Love

Lay down your arms and surrender to me
Oh, lay down your arms and love me peacefully, yeah
Use your arms for squeezin' and please
I'm the one that loves you so
Oh there ain't no reason for you to declare
War on the one who loves you so
So forget the other boys 'cause my love is real
Come off your battlefield
Lay down your arms and surrender to me
Yeah, lay down your arms and love me peacefully, 
Use your arms for squeezin' and please
'Cause that's the way it's gotta be
The weapons you're using are hurting me bad
But someday you're going to retreat
'Cause my love baby is the truest you've ever had
I'm a soldier of love that's hard to beat
Lay down your arms and surrender to me
Lay down your arms and love me peacefully, yeah
Use your arms to hold me tight
Baby I don't wanna fight no more 
Oh baby, lay down your arms 
Please baby lay down your arms


Casal à beira do Rio Sena - Paris

 por Bárbara Camozzato Rabelo.

domingo, 6 de janeiro de 2013

Cuida!






Guarda!

Eu te guardo aqui no peito.
E te espero chegar.
Eu vejo aquela tarde de sol, e ainda sinto teu gosto na boca.
Teu cheiro na pele.
Tua alma na minha.
Mãos que me lavam, braços que me sustentam.
Esse espaço entre os seus dedos...
Me manda esses sinais mas não entendo o que me dizes.
Se fogem ou procuram seus olhos, é palavra muda em minha boca
Tira meu escudo e te descobre.
Deixa-me ver-te.
Deixa-me estar, um beijo só.
Guarda! que foges de mim, e podes não voltar.
Não te percas na longitude da minha sombra.
Escuta,  que vou! Em um dia de sol, uma tarde nublada, uma solta primavera, outros passos, me vou...





A fotografia foi tirada no Jardim Botânico de Paris. Ao caminhar, me deparei com a solitária senhora, em meio as flores, observando a vida passar. Me pareceu oportuno associar a imagem ao poema.